Como já comentei, quando assisti ao documentário “Criança, a alma do negócio” pela primeira vez, durante um evento promovido pelo pelo “Instituto Alana no ano passado, a cena que mais me entristeceu foi a que mostra um grupo de crianças optando entre as palavras “brincar” e “comprar”. A escolha pelo “comprar” foi unânime e espanta até mesmo a menorzinha de todas as crianças do grupo, que questiona: “ninguém gosta de brincar??”
Sou uma otimista e, sinceramente, não acredito que as crianças de hoje simplesmente deixaram de gostar de brincar. Prova disso é o “Mapa do Brincar”, que a Folha de S.Paulo lançou este ano, cheio de brincadeiras como a “cama de gato”, que eu adorava e já tinha esquecido como funcionava (tem um vídeo no site que mostra direitinho como é). Mas acho que temos sido presas fáceis demais para algumas armadilhas desse mundo consumista em que escolhemos viver.
Durante a pesquisa que fiz sobre o consumo na infância ao longo do ano passado, descobri estudos que constataram algumas coisas importantes:
- Pais que se sentem culpados por não dedicar tempo suficiente à família têm muito mais dificuldade de dizer “não” aos pedidos insistentes dos filhos, mesmo quando acreditam que o que eles tanto desejam não é bom ou não é saudável para eles;
- Pais que cedem a todos os caprichos dos filhos, além de correrem o risco de se endividar, estão deixando de ensinar algo muito importante para o desenvolvimento da criança: a frustração. Pessoas que não aprenderam a lidar com a frustração na infância podem sofrer bastante quando se deparam com as inevitáveis frustrações da vida adulta;
- Brincar, além de uma maravilhosa forma de lazer, é fundamental para a formação da criança. É por meio da brincadeira que elas aprendem a solucionar problemas, desenvolvem a criatividade, o autocontrole e expressam seus sentimentos. Por isso, o brinquedo ideal não é o mais caro, nem aquele que faz tudo sozinho (já reparou como as lojas estão cheias de brinquedos que “brincam pela criança” ou que já chegam com a brincadeira brincadeira pronta e empacotada?). Como explica a estudiosa norte-americana Susan Linn, “os brinquedos que encorajam a brincadeira criativa são aqueles que estão lá parados até que a criança faça alguma coisa com eles. Os brinquedos verdadeiramente criativos requerem esforço. Um brinquedo que anda, fala, dança, faz barulhos ou se move ao apertar de um botão encoraja passividade, não criatividade. Se queremos que as crianças se tornem adultos ativos, curiosos e criativos, precisamos proporcionar a elas logo cedo um contato ativo com o mundo, reagindo ao que é apresentado a elas”.
O dia das crianças acabou de passar e imagino que muitos pais tiveram que usar o parcelamento do cartão de crédito para dar aos filhos o que eles pediram. Daqui a pouco já chega o Natal e, junto com ele, mais presentes. Presentear quem a gente ama é uma delícia, mas é bom ter em mente que fugir do que o mercado está ofertando enlouquecidamente pela televisão é saudável não só para o seu bolso, mas também para seus pequenos.
Para quem quer saber mais sobre o assunto, vale a pena ver o documentário que mencionei e dar uma lida na última newsletter do projeto Criança e Consumo, que trata exatamente desse assunto.